19.1.23

Vulnerável coração

 

Meu mestre, Daisaku Ikeda, disse uma vez:

“a paixão é um sentimento por demais tempestuoso

para deixar que lhe conduza a vida”

 

A pessoa que se apaixona (de maneira não correspondida)

Fixa morada (arma uma barraca)

Às margens de um rio (espiritual)

Do qual ela não beberá a água (néctar dos deuses?)

E nem pescará o peixe (o pão nosso de cada dia)

Sendo que, eventualmente, esse mesmo rio transbordará

Levando embora barraca e sonhos

 

A pessoa que vive uma paixão (não correspondida)

Anda desprotegida na noite escura

Desarmada no breu da noite

Roendo as unhas pela madrugada

Cheirando pelas esquinas uma flor nenhuma

À procura de luz

 

E mesmo que a lua surja

No caos da madrugada

E seja eu mesmo que brote da terra

Apenas poderei ver teu brilho

Espelho perfeito do sol

Sem nunca, jamais, tocá-la

Nem mesmo em sonhos

 

A pessoa que se apaixona

No caos da madrugada

Se lança ao mar

Em frágil embarcação

Sem temer a procela

Que decerto há de devorá-la


E, ainda que, no momento derradeiro

Deseje ardentemente sentir o vento oportuno

Aquele que leva de volta a um porto seguro

O caminho é para a frente, e sempre abaixo

Afinal, é da natureza da água descer ao nível mais inferior

 

Assim foi no cortejo de Quincas Berro D’água

Aquele que morreu duas vezes

Amando aguardente mais do que a própria vida


Decerto, mestre, que viver não é preciso

Mas navegar sim


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