19.1.23

Querida Isabela

 

Li teu livro, Compêndio para moças de olhos lânguidos, cuidadosamente elaborado, sério, impecável, porque imbuído da determinação de um raio de luz que adentra no fundo de um arquivo morto, um cemitério, antes hospício e prisão, mas de onde, escamoteadas por todas as pilhas de papéis e fungos e ácaros, toda a taxonomia burocrática e perversa que mutila qualquer subjetividade, de onde se capturaram vidas, das quais, todavia, ainda que tenham deixado esse plano terrestre, é possível escutar, um pulsar.


Li teu livro de maneira célere, porém intermitentemente terrificado, sentindo-me algo sufocado, porque sem fôlego, mas também prazeroso por haver imergido e estar submerso por vontade própria, tornando-me absolutamente encantado pelo labirinto da fauna de cabeça de útero, a vaca profana que pariu o Minotauro, Pasífae era seu nome.


Ponderei sobre a Carta XI do Tarô, Força, a mão da mulher sobre a cabeça da fera.


E sobre o uso excessivo da força – típico dos homens – a absoluta covardia.


Que tortura, desfigura, estraçalha, dilacera


A vida quente, tenra, mole e absolutamente frágil


Que teima em se revigorar a cada dia


Como a relva grassa


Como a luz da manhã


No mais, gostaria de conversar com você sobre cada um dos textos e imagens que compõem teu livro, minha querida amiga jogadora de filacantos, sobre todas as minúcias que contêm, muita riqueza, toda joia é um fragmento, mas teu livro é um caleidoscópio de pedras preciosas. Estou maravilhado com tua coragem e feliz por tua existência, que encontrou seu “chão” em vida, e mira as estrelas no firmamento, tuas iguais de outrora.


Ps. Acredite ou não, pouco antes de ler “coração imortal”, escrevi o poema “vulnerável coração”, o qual compartilho contigo: