17.11.20

É magenta


 Encontrei a divindade
refletida num raio de luz
sobre a superfície d'água

11.11.20

É triste mas é verdade: é tudo mentira

 A grande verdade
O grande sentido
Sem uma
E sem outro
Sabe
Sem saber
E segue
Sem seguir
Segue
Com S de super
Com C cú
Cegue
Sem cegar
Segue
Agora
Com uma
E também com outro
Só pelo prazer de desdizer essa que veio desdizer

de autoria do Ciro Bastos, de presente para mim

8.11.20

Erótica

Vontade desejante,
que transita entre
o calor em brasa
e o frio aconchegante

para Natália Nolli Sasso

Sinal vermelho


 Quando o bico do corvo
é o próprio corpo

(sobre dores físicas e pesadelos que inventei entre os dias 5 e 6 de novembro)

25.10.20

Moduloris


 Eu sou a trena
A vida é a medida

para Originais do Samba e Le Corbusier

15.10.20

Refrescância no meio do mato


Atualmente
A minha cota-parte de cachoeira
é essa garoa primaveril
e algum cheiro de terra molhada

18.9.20

Ascensão


Seja lá o que são os séculos e séculos, depois de encontrar contigo, e ser fulminado pelo brilho dos teus olhos, todas as areais do Tempo são ressignificadas pela pureza do fogo e a profundeza das águas, como um vento forte que refresca a face e desanuvia pensamentos.


para Letícia Helena Santa Cruz

25.8.20

Uma nova aurora


Já no fim da madrugada
Recebo mensagens
De sambas do amanhã

para Flávio "Tatico" Rubens

8.2.20

Melhor momento


Lua cheia em Leão
Damas da noite carregadas
esbanjando perfume e flor
Pedir a benção

4.2.20

Sonho de uma noite de verão

Sonhei com um crocodilo preto, gigante, um alligator, prostrado na cumeeira seca da Rua Itinguçu, do tupi, água branca encorpada, lugar onde se produzia leite de vaca. Ele era imenso. Logo depois, a cidade inundou, e os crocodilos atacavam resilientes pedestres, que trocavam sopapos com os encorpados répteis, enquanto carros amedrontados davam marcha ré.

1.1.20

Enredo de um ano ímpar

Resolvi escrever uma retrospectiva sucinta sobre 2019, período de um ano, de trezentos e sessenta e cinco dias entre o passado e o futuro. Muita coisa ficará de fora. Lembro-me de pequeno, mãe e pai incentivaram os registros de expressão: desenhar em qualquer meio, cantar, abraçar, rir. Já um pouco mais garoto, sentia certa inveja dos diários cor-de-rosa das meninas, essas escritoras precoces, cheios de caligrafia cuidadosa, relíquias e penduricalhos. Nunca gostei de vestir o uniforme azul da escola. Lembro-me de uma citação de Saramago, em um dos seus cadernos da Ilha de Lanzarote: “ninguém escreve um diário para dizer quem é. Por outras palavras, o diário é um romance com uma só personagem”. Eis que, em 2018, me vejo encarando a “doença sagrada”, como no livro de autoria – não comprovada – do primeiro médico da antiguidade grega, Hipócrates. Encarando minhas paixões (Patos), inseguranças e limites, sucessos e decepções. Alegrias, desencantos e desacatos. Buscando equilíbrio na insustentável leveza do ser, essa frase magna da balança da vida, como em tantos outros nomes de livros e infinitas formas de memória. Entre o esquecimento e a continuidade. Candomblé, a dança na casa de pau a pique e sapê, com o batuque de atabaques e as oferendas da natureza farta e infinda. A sabedoria sobre os astros perenes e errantes, sobre as fases da Lua e o giro da Roda Helicoidal. A abertura do relacionamento entre o cuidado de si e do outro. A parcimônia de preferir o silêncio ao embate. Não que tenha sido possível. A retomada da prática do Budismo, desde o “Tempo sem Início”, até a “Carta de Ano Novo”. Graças a Deus. Aprendi, no sofrimento da dor e do amor, sobre a continuidade e a ruptura, sobre a liderança e a servidão. Mesmo o cavalo mais vigoroso eventualmente cai. Aprendi sobre as águas, ou melhor, as águas me ensinam desde que aprendi a senti-las, do oceano sagrado até o sacrificado Tietê, de Brotas até a Cachoeira sem Fim. Venho aprendendo. Assim como sinto imenso prazer em observar o firmamento entre o céu e a terra, entre a água e a rocha. De entrar numa caverna e sentir o medo profundo de apagar luz. E o fechamento desse período se inicia como uma promessa para 2020, assim como as possibilidades de outros votos de anos novos: aniversários, outros calendários e datas comemorativas, feitos memoráveis, carnavais e quarta feiras de cinzas, feriados e festas juninas, a pequena rotina das vivências fantásticas, e o grande tédio dos entes maléficos. Oremos e celebremos o que há de melhor na vida, que o mal chore e dê alento. Dizer para meu irmão (irmão e irmãs): “estava dentro de uma cachoeira, no fundo de uma caverna, e pensei em você”.