Pra segurar o desejo

Quando você passa

eu mordo o lábio

Cuidado de si

Não tem dinheiro que pague saúde

Nem o brilho nos olhos da juventude

Talokey?

Até mesmo para um apreciador de cús

Bostonaro foi difícil de engolir

Comido com pimenta está

Arrotado caviar

Júpiter Lunar

Cor e ação

"amor e fúria"

arroz é base

(C)oração essência

Pois o silêncio pode ser prisão

Mas a palavra é benção

Tapa na cara

um delicioso bofete

para Letícia Helena Santa Cruz e Melina Izar Marson

Para enfrentar a morte

Deixar crescer dentro de si

uma luz bem grande e forte

beleza flor

para Letícia Helena Santa Cruz

Anzol

Se for para pescar, que seja uma sereia

Melhor pescá-la que ser pescado por ela

para Valmir Godoy

Farpa

A pérola entre duas conchas

cultiva a ostra, um capricho preferido

no fundo do casulo a lagarta pulsa

o bater asas, de um sonho infinito

a belicosa forja, da justiça

lapida o verbo, num silêncio atento

à céu aberto grassando a relva

numa qualquer fresta no concreto

A bela do Lago Ness

Lacustre

para Alexandre Delikaikov

À espera de te encontrar

Mais uma garrafa ao mar. Sei que é difícil que a encontre, que as marés e correntezas façam um pacto para levar essa mensagem até ti, expectante, boiando numa redoma, elas que embalam cardumes de peixes, aos bilhares, tal qual estrelas no céu, como se soubessem em que ilha, continente ou galáxia te haveriam de encontrar. Mas preciso jogar a garrafa, ou ela precisa que eu a jogue, suplicante por partir, como um corvo ou pombo-correio tem missão fincada à perna, impelindo o auspício de seguir a rota, com asas fortes picar a trilha, à frente o bico, leque e facão, revolver-se no poleiro ante ao vento e pular na imensidão do céu, assim também a garrafa está cheia de ar. A garrafa foi jogada, ou talvez seja eu que me jogo nela, como a flecha soberana estica o arco e dobra o braço, tensionado os músculos, é pra isso que servem, na ânsia de conhecer o abismo é melhor que se tenha asas, ou guelras para que não afogue ao submergir, pois pular bem fundo é igual a voar alto, não há diferença absolutamente, a não ser a pressão atmosférica e a umidade relativa, afinal a queda também pode ser um momento de júbilo, como a lua cheia despontando no ocaso do sol. Jogo a garrafa ao mar e me jogo dentro dela, corpo e espírito, o mar que é cheio de líquido, e a garrafa que é cheia de ar, de palavras que ficam à deriva, errantes, sem rumo...

Primeiro foi um segredo

Guardado miudinho, junto a tantos outros, por que não? Mais uma invenção do acaso, como aquela semente que, voando ao vento, numa fresta em meio ao concreto de terra encontrou morada. Rachou o cinza, coração de pedra, depois começou a vazar, embrulhar o estômago, arrepiar calafrios, provocar alucinações...

Foi coincidência?

original de 27.12.2016

Brasil, ou "braseiro"

Como transformar um paraíso

em um inferno

em poucos séculos

Implacável

hoje é dia de Vênus

mas amanhã é Sábado

de Saturno

A beleza de ontem
consiste em exaltar
o Tempo de hoje

Pesá-lo na balança
Agradecer a oportunidade
E reverenciar a foice

para Victor Heringer

Impenetrável patuá

Fortaleza sem nenhuma brecha
Nas juntas de pesadas rochas
Nenhuma fresta entre as pedras

No máximo forçoso cerco
Castelo do impossível ataque

Fechado o corpo em amuleto

Fazer do coração um templo

Criar um tempo circular, uma imagem minimamente poética, que ressignifique o tempo linear das palavras, estas tão efêmeras e invisíveis como o vento, fazer poesia com linhas, trabalhá-las, dar a elas forma, extrair a fibra das folhas de bananeira, de bambu, do cânhamo, tecê-la para fazer roupa, urdidura e trama, trançar rede pra dormir e pra pescar peixe, amarrar nó forte e que desfaz, esticar para fazer cordas e com elas tocar música, envergar o galho seco da árvore e amarrar as pontas e torná-lo arco, esculpir dos galhos as flechas, emplumá-las, na ponta pedra afiada, cerrar a vista e mirar no céu o alvo em movimento, olhar à frente os olhos do inimigo, o arco teso, a flecha esticada, inspirar, espirar, soltar, precisão, velocidade e força...

Feel like no other

nem verde amarelo amazônia transgênica

nem vermelho sangue da cor do pecado

a cor do Brazil hoje é laranja rosa choque

motori$ta de luxo

e cavalo guerreiro passando recado

para João Agripino Dória Júnior

Marte em Áries

Feliz ano novo

rebentos deste mundão agreste

de tretas e paixões!