Caderno de notas de um arquiteto
canhoto.
Hoje minha consciência se
expandiu. Eu trabalhei nos projetos da copa por um tempo, e via aqueles perímetros
de isolamento no raio do estádio, mas eram só linhas abstratas, não me diziam
muita coisa além do que mostravam: isola-se um perímetro urbano para um evento
específico, sob custódia de uma administração local.
Nos últimos dias é que pude
perceber, AO VIVO na telinha, o que essas linhas significaram, de vários modos, seja através de fotos, vídeos ou textos, no cenário brasileiro atual: todas as gentrificações realizadas.
Esse evento específico, futebol,
esporte popular, de especial e volátil ascensão - vulgo status quo, social, econômica, nos ânimos. E aqui no Brasil, terra onde se bate uma bolinha em qualquer lugar, justamente por ser um
esporte popular, diz respeito à sua relação com o espaço público, o espaço em
volta do estádio mesmo, sempre um “não lugar”, ou um lugar de devir, de
passagem, ante à concentração para o espetáculo, que é na verdade um outro evento.
E que, dando nomes aos bois, essa custodia que foi concedia pelo Estado à FIFA
é INCONSTITUCIONAL.
Em miúdos, vetou em muito o
direito de ir e vir, seja da galera da geral, seja das baianas do acarajé, seja
dos capitães de areia, seja do vendedor de pipoca e caldo de cana, seja dos
milhões de vagabundos que ficariam de vadiagem, aumentando a “festa”.
En passant, já que é
inconstitucional, os caras bem que poderiam ter priorizado uma política “populista”,
de boa-vizinhança, alargado a bitola do filtro, por a música e deixar tocar,
mas não, os caras são muito idiotas e mandam DESCER O CACETE. Gostei do logo:
DENTRO DO ESTÁDIO: TETRA – FORA DO ESTÁDIO: TRETA, nada mais sintético.
Mas, sobretudo, a questão é que
esse espaço fora do estádio tornou-se palco de lutas da polícia, arma
amalgamada Estado-FIFA, e manifestantes em protesto; para lá do público que consegue
adentrar o estádio e conquista seu lugar cativo, afinal não tem arquibancada
para todos, mas só para uma minoria seleta.
Parafraseando respectivamente
Baudrillard, Debord, Platão e Marx, as maiorias silenciosas fazem sombra onde
há espetáculo, por questão de ignorância e mais valia.
Parafraseando Foucault, há um
problema de espaço, em um circuito de tempo.